Sala em casa de Marcos. Porta no fundo e à direita, mesa e cadeiras.
Marcos, sentado junto à mesa e, a seu lado, Rosinha e Miguel. Marcos mostra no semblante abatimento.
Marcos - Meus filhos, pouco tempo poderei viver. As forças abandonam-me. Tenho presentimento que minha morte bem próxima está...
Rosinha - Meu pai, não desanime! Espero em deus que esta sua moléstia será passageira.
Marcos - Passageira? Quando a vida assim se desorganiza é inevitável o seu fim.
Miguel - Esse temor é que pode tornar a moléstia grave, quando talvez seja ela ligeira, e em grande parte devida aos anos.
Marcos - Devida aos anos é ela, mas não como pensas... Os anos a têm exarcebado. Deus o sabe como!
Rosinha - Mas os médicos...
Marcos - Que pode a medicina em moléstia com a minha? Aos médicos não torno a culpa, que fazem eles o que aprenderam, e o que podem. A ciência é muitas vezes ineficaz.
Miguel - Se meu pai consultasse outro médico...
Marcos - A outro? Que mais queres que eu faça? São poucos os que aqui têm vindo? O meu médico assistente, o Dr. Cautério, é homem de reputação bem adquirida.
Miguel - Não contesto. Antigo, rotineiro e feliz muitas vezes, mas se meu pai não tem colhido vantagem com seu tratamento, para que não chama, por exemplo, um médico homeopata.
Rosinha - Assim é.
Marcos - Não creio em homeopatia.
Miguel - Se não a conhece! Peço-lhe um favor: um de meus verdadeiros amigos é o Dr. Miléssimo. Há pouco que chegou de Paris, aonde estudou com muita aplicação a homeopatia. permita que venha ele fazer-lhe uma consulta.
Marcos - Debalde! nada espero...
Miguel - O que lhe custa? deixe-o vir; talvez tire-se proveito.
Rosinha : Eu estou persuadida que ele será capaz de o por bom.
Marcos - Pois bem, que venha. Não quero que se queixem de mim. Ouvi-lo-ei; pouco me custa.
Rosinha - Já eu creio v~e-lo restabelecido e passeando alegre por esta sala.
Marcos - Alegre?... (levanta-se) escuta, Rosinha, falemos de ti, que és moça e que ainda podes viver longos anos - que isto por cá está velho e desarranjado. Quando eu morrer...
Rosinha - Meu pai!
Miguel - Senhor!
Marcos - Quando eu morrer, ficareis desamparados...
Miguel - Oh, enquanto eu viver, minha irmã...
Marcos - És oficial de Marinha; hoje estás aqui, amanhã ali...Precária proteção! de um marido precisa tua irmã - e este já escolhi.
Miguel - Quem é?
Marcos - O meu amigo Lino das Mercês.
Rosinha - Meu Deus!
Miguel - Ele?
Marcos - É um homem probo e honrado; tem a alma de um anjo. Farte-á feliz. Isso posso eu dizer poruqe o conheço há muito tempo. Tenho-lhe estudado caráter; andamos juntos na escola e desde esse tempo dura a nossa amizade.
Miguel - Marido tão velho!
Rosinha (à parte) - Andaram juntos na escola!...
Marcos - És um rapazola, Miguel, e só aos da tua idade julgas capazes de tudo. Tu, minha Rosinha, tens mais juízo. Isto é um louco. Meu amigo Lino far-te-á feliz.
Rosinha - Mas, meu pai, não desejo casar-me, e se ...
Marcos - Crê, filha que à borda da sepultura ponho todo desvelo em fazer-te ditosa... Casar-te-ás com ele, em breve, que assim te pede teu pai...
Rosinha (à parte) - Não é possível, meu Deus!
Miguel (à parte) - Veremos como isto será...
terça-feira, 4 de novembro de 2008
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