sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Uma conversa para (não) matar os grilos...


Sexta-feira, 17/09/1976


1. O Chico encontrou com o João no Beirute e conversando sobre o que estava acontecendo na Oficina diz que o Carlos tinha reagido como reagiu porque estava enciumado: o texto original que havia sido preparado por ele havia sido abandonado.

2. O João conta pro Carlos apenas esta parte da história: Aconteceu uma coisa horrorosa! O Chico me disse que você está com ciúmes, tá enciumado e , por isso, foi contra as peças apresentadas.

3. A Anae outros tomam as dores do Carlos. Consolam o Carlos: “Imagine pensar que o Carlos é capaz duma coisa dessas”. O Carlos chora.

4. A turma tá reunida pra aula. O Carlos fica lá fora. A Ana vai buscá-lo. Os dois entram abraçados. O Chico propõe que se converse. Uma conversa para que todos digam como se sentem na experiência e como vêem os outros. Uma conversa pra matar os grilos.

  • O André diz que não tá afim de fazer a peça infantil porque tem muita gente fazendo este tipo de trabalho aqui em Brasília.
  • Chico: Eu sabia que havia certos fluidos negativos. Certas opiniões contra a realização da peça. Foi bom ver isso confessado.
  • Ana: Não foi bem isso que o André quis dizer.
  • Chico: Foi exatamente o que ele disse. Por favor. Não precisamos de advogados de defesa aqui dentro.
  • Carlos: Não tô mais afim de fazer a peça infantil porque fiquei sabendo que disseram que eu estava com ciúmes dos textos que apareceram. Tô muito chateado, não esperava isso...
  • Ana : Ele até chorou ontem de tão chateado.
  • Carlos: É, eu chorei...
  • Chico: Fui eu que disse lá no Beirute ontem pro João. Disse e continuo dizendo: o Carlos tava enciumado. O que, aliás, é muito normal. A gente tem ciúme da mulher, dos amigos, dum colega que se destaca mais nos trabalhos. É uma coisa que existe: o ciúme. João você contou pro Carlos toda a nossa conversa ou só este pedaço?
  • João: Não eu não falei sobre toda nossa conversa.
  • Chico: Eu sei disso.
  • João: Mas eu não quis fazer intriga.
  • Chico: Disso eu também sei.

Depois da aula à caminho do departamento de Comunicação:

Chico: Tô cansado. Que classe social! Que juventude! Que época! Eu sou filho de operário, entende? De operário! Não faço parte disso aí... delação, covardia, sabotagem. Ficou claro pra mim hoje: o Pedro, a Laurete, o Arão o Durvalino inconscientemente querem sabotar a peça. E o que fazem? Criam dificuldades. Todo dia propõem uma nova maneira de se fazer. Ficam muito unidos, à parte.

No sábado:

Queremos entender o que se passou desde o início do curso.
O Chico fez este esquema no quadro:

  • A gente queria fazer
  • contava apenas com a convicção que isso se faz
  • experientes atacam de técnicas e métodos
  • fala-se que isso é babaquice
  • atacam de novo com: “não sabemos falar assim difícil”
  • Mas quem ta falando difícil?
  • Atacam de sabotagem, ameaçam greve, cobram honestidade, delatam.
Diagnóstico: Na sociedade existem já produzidas todas essas coisas. Quem nunca faz nada não sabe fazer nada. Não tolera que se faça e combate de vários modos. O importante é competir (combater). Salvam-se, na sociedade, os que se unem na maioria inoperante. O terror é o seguinte: se algumas pessoas fizerem alguma coisa, isso é uma denúncia viva dos inoperantes. E... pense o seguinte: essas pessoas (inoperantes) têm prestígio social de inteligentes e criticam justamente porque não deixam fazer as coisas dizendo que elas não dariam certo – de fato têm de evitar a todo custo que alguma aconteça.

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